‘Aguardamos diálogo com a nova gestão do Sesc’, afirma Movimento Salve o Parque
A segunda audiência pública sobre o Parque Temático de Santa Teresa, realizada pelo Movimento Salve o Parque e o gabinete do deputado Fabrício Gandini (Cidadania), evidenciou as ilegalidades contidas na doação da área verde de 100 mil metros quadrados feita pelo ex-governador Paulo Hartung ao Sistema S, para a construção de um hotel pelo Serviço Social do Comércio (Sesc).
A avaliação é da coordenadora do Movimento, a ambientalista Carmem Barcellos, que ressaltou a ausência de diálogo e a necessidade de uma mudança de postura por parte do Sesc, considerando especialmente que uma nova diretoria assumiu a gestão da entidade em junho passado. Na segunda audiência, por exemplo, realizada na última quinta-feira (30) em Santa Teresa – a primeira ocorreu na Assembleia Legislativa, em Vitória – o Sesc não enviou nenhum representante.
"O movimento Salve o Parque está esperando uma atitude mais amigável e mais ponderada da nova gestão do Sesc, porque até aqui o Movimento tem sido ignorado. Mas o Movimento tem se fortalecido a cada dia. A audiência foi um sucesso, muita gente presente, muita gente favorável que o parque permaneça em Santa Teresa. Então é importante que o Sesc reconheça o movimento e abra as portas para uma negociação, porque se não a gente realmente vai ter que tomar outras providências que podem anular qualquer possibilidade de usar a doação da área do parque para construção de um Sesc em Santa Teresa", declarou a ambientalista.
Presente no debate, o advogado Pedro Domingos, relatou sua análise jurídica preliminar do caso, evidenciando duas fortes ilegalidades presentes no ato de doação da terra: a transformação de um projeto de parque ambiental em um empreendimento hoteleiro, sem os devidos estudos ambientais, e a falta de consulta à população da cidade, que é a maior atingida pela mudança de finalidade da área.
Ele destaca que a área foi entregue pelos moradores de Santa Teresa – a doação de terra foi feita por Aurélio Gramlich ao governo do Estado – para que fosse transformada em um parque natural para a população, onde funcionaria a casa de inverno do governador. E essa finalidade foi alterada quando Paulo Hartung doou o espaço para a construção de um hotel, sem os devidos estudos e consultas. Entre eles, estudo de impacto ambiental prévio, estudo de impacto urbano, estudo de impacto hídrico e sanitário, além de estudos que mostrem a compatibilidade da atividade econômica com a manutenção e a sustentabilidade daquele microambiente, caracterizado por Mata Atlântica, do tipo Floresta Ombrófila Densa. "Esses estudos não foram realizados antes da transferência não onerosa da doação", ressalta.
Interesse da sociedade é soberano
Pedro Domingos explica ainda que "quando o primeiro dono doa para o Estado com intenção de preservação, o ato administrativo de doação não onerosa deve contemplar esse intuito da população. É uma área de proteção ambiental. Essa primeira prioridade deveria ter sido respeitada".
A doação realizada por Paulo Hartung, acentua, "não é um ato administrativo simples", por tratar-se de "tutela do bem ambiental", o que configura que "a prioridade é a preservação do meio ambiente". Por tratar-se de um "direito coletivo e difuso", destaca o advogado, o assunto aborda um "interesse público primário", que, pelo Direito brasileiro, "transcende o interesse secundário ou interesse administrativo do próprio Estado".
Como comparação, ele explica que a decisão do Estado de se desfazer de um prédio não utilizado, doando a uma entidade híbrida como o Sesc, mediante uma contrapartida de manter o local como uso coletivo, mesmo que não público, é razoável. Mas quando trata-se de proteção ambiental, direito coletivo e difuso e interesse público primário, "é preciso colocar em primeiro lugar o interesse da sociedade", por isso, "se os interesses administrativos do Estado se sobrepõem ao interesse público primário, [o ato de doação] deve ser questionado".
Caminhos jurídicos
Pedro já acompanha o caso desde 2018, quando a Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Espírito Santo (OAB-ES), motivada por denúncias de moradores, realizou uma audiência pública sobre o caso, no auditório da Câmara de Vereadores de Santa Teresa. Na época presidente da Comissão de Meio Ambiente da OAB-ES, o advogado hoje se disponibilizou a fazer uma consultoria voluntária para o Movimento Salve o Parque, diante da gravidade da situação.
Ele vislumbra algumas alternativas para anular a doação, mediante as ilegalidades evidenciadas: o próprio governo do Estado entrar com uma ação anulatória, a Assembleia Legislativa elaborar um projeto de lei com esse objetivo ou ainda haver o desfecho do julgamento da ação popular impetrada em 2013 (processo nº 0002238-07.2013.8.08.0044).
A primeira decisão sobre a ação ocorreu em 2014. Em seu despacho, o juiz da Vara Única do município, Alcemir dos Santos Pimentel, acolheu em parte os pedidos da ação, permitindo a construção do hotel, mas desde que o Sesc garantisse o acesso da população ao parque e sendo responsável por sua manutenção. O Sesc recorreu e nenhuma outra decisão foi tomada desde então.
Na próxima segunda-feira (4), o deputado Gandini afirma que uma reunião do Movimento irá estudar esses caminhos jurídicos para definir os próximos passos da luta.
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